segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

5 Perguntas para Paulo Ramos

Paulo Ramos é um dos mais respeitados jornalistas de quadrinhos da atualidade. Com sólida carreira em redações de grandes veículos de comunicação, é também professor universitário e autor.

Seu Blog dos Quadrinhos é uma referência para quem quer se manter bem informado sobre este segmento. Não à toa, tanto Paulo quanto o blog foram premiados com o HQ Mix no ano passado.

Ele está lançando o livro A Leitura dos Quadrinhos, pela Editora Contexto, em que disseca os vários recursos narrativos da nona arte.

Paulo Ramos responde as 5 Perguntas do Papo de Quadrinho desta semana:

1) Quando foi que você resolver fazer dos quadrinhos (que, acredito, sejam uma paixão de criança) sua tese de doutorado e, depois, matéria-prima do seu trabalho jornalístico?
A ideia de estudar quadrinhos academicamente vinha desde os tempos das graduações em Jornalismo e em Letras. Após me formar, no fim de 1995, iniciei um mestrado sobre a área na Unicamp. Tive de abandonar, no entanto, para me dedicar à carreira jornalística. Em 2001, decidi voltar a investir na vida acadêmica e retomei o projeto, agora na USP. Foi o que levou ao doutorado, defendido em 2007. A relação jornalística com os quadrinhos surgiu em 2006, quando trabalhava no grupo Folha-UOL. Fiz um comentário interno dizendo que o portal tinha poucas notícias sobre quadrinhos. Recebi, como resposta, uma pedido de sugestão. Propus um blog jornalístico, com notícias diárias sobre a área. Foi assim que surgiu o Blog dos Quadrinhos, ligado à redação do UOL.

2) Seu blog se diferencia dos sites de notícias de quadrinhos por trazer poucos posts por dia, porém mais aprofundados, apurados e checados. Como você seleciona o que é notícia?
A proposta inicial do blog, desde o início, era a de dar um "tiro por dia", como costumo dizer. O diferencial seria a qualidade da notícia e do texto, sempre com um tratamento jornalístico, e não o volume de informações. Acredito que tenho conseguido cumprir essa meta. A quantidade de notícias sobre a área é impressionante e precisa, como tudo no jornalismo, passar por um crivo editorial. Uso diferentes critérios para selecionar o que noticio: ineditismo do tema, urgência da informação, qualidade da notícia, importância do assunto. Tento também sempre me colocar na posição do leitor. Eu, como leitor, gostaria de ler essa informação? Como se vê, não é nada muito diferente do que fazem as redações de jornalismo. Mas um cuidado que sempre tomo é o de tornar o assunto claro para quem normalmente não lê quadrinhos.

3) Você acha que o leitor de quadrinhos ainda sofre preconceito?
Sofre, sim. Historicamente, os quadrinhos sempre foram algo vinculado à infância. Ainda existe essa visão, a de que quadrinhos são coisa de criança. Tanto que o adolescente e o adulto que continuaram lendo trabalhos quadrinísticos formaram uma espécie de maçonaria, um grupo meio à parte da sociedade. Note que os leitores de quadrinhos no Brasil sempre tiveram esse tipo de comportamento, que tende a ser discriminatório, jocoso. Mas vejo um ensaio de mudança nos últimos anos. A grande novidade é que os quadrinhos passaram a ser vistos com bons olhos por instrumentos formadores de opinião, como a lista de obras que o governo federal distribui às escolas. Isso tem levado o assunto à força ao não-leitor e posto em choque a visão tradicional sobre o assunto. Vemos, hoje, um claro embate desse discurso novo com o "tradicional", herdado de gerações passadas.

4) Recentemente, você divulgou o lançamento ou relançamento de várias obras teóricas sobre quadrinhos (Falas & Balões, Narrativas Gráficas, A Magia dos Quadrinhos) e você mesmo está lançando A Leitura dos Quadrinhos. Por que a arte sequencial tem sido objeto de tantos estudos?
Minha leitura é que a ida dos quadrinhos para o campo do ensino - em vestibulares, programas governamentais etc. - obrigou a academia a dar respostas à adiada falta de estudos sobre o assunto. Os quadrinhos - salvo raras exceções - foram ignorados pelas universidades brasileiras no século passado. Agora, vê-se a necessidade de estudar o assunto, embora ainda com resistências de alguns acadêmicos. Outra novidade nessa mudança de discurso sobre os quadrinhos são exatamente as dissertações e as teses produzidas nos programas de pós-graduação. O discurso científico, levado à grande sociedade, tende a dar uma autoridade teórica à linguagem, algo que, no país, ainda não existe. Note que, para justificar os quadrinhos, muitos ainda os chamam de "literatura" ou "forma de literatura". Isso nada mais é do que dar um rótulo socialmente aceito, a literatura, para nomear uma linguagem historicamente vista como marginal ou infantil. Abordo esse tema no primeiro capítulo de "A Leitura dos Quadrinhos".

5) Os quadrinhos já viveram as Eras de Ouro, Prata, Bronze... Na sua visão, em que "era" estamos hoje, quando ela começou e o que a caracteriza?
Sou um dos poucos que não concordam com essa divisão em "eras". Essa separação funciona, talvez, para os quadrinhos norte-americanos. Mas a história da história em quadrinhos é muito maior do que o que foi produzido nos Estados Unidos. Veja o caso dos mangás e dos trabalhos europeus, para ficar em dois exemplos. Por isso, não saberia precisar em que "era" estamos hoje. O que podemos dizer, no entanto, é que a internet tem trazido fortes mudanças à área, tanto no processo de produção quanto no de veiculação. Hoje, as melhores tiras brasileiras são produzidas na internet, e não mais nos jornais. Esse impacto da meio virtual é algo que precisa ser observado bem de perto.

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